O negócio da gestão profissionalizada
O 3.º Business Breakfast Publituris Hotelaria focou-se na gestão de activos hoteleiros. Margarida Almeida, da Amazing Evolution; Francisco Nogueira de Sousa, da Blueshift; Marco Rodrigues, da OCRAM; e Miguel Velez, da Unlock Boutique Hotels; foram os convidados desta edição.
Hotéis Octant em Ponta Delgada e Furnas promovem atividades vínicas
Groupe GM marca presença na Decorhotel para apresentar novidades
Universidade Europeia e Câmara Municipal de Cascais assinam protocolo de cooperação
Crowne Plaza Porto lança Porto Urban Spa com as marcas PostQuam e Rituals
Six Senses Douro Valley aposta da diversificação de mercados
58 hotéis na Tailândia distinguidos com Chaves Michelin
Parque Terra Nostra investe em obras de valorização do tanque termal
2ª fase do programa “Competências do Futuro Algarve” com 28 ações de formação e sete ‘bootcamps’
Algarve reduz em 13% consumo de água com selo “Save Water”
Alojamento Local dos Açores pede reforço do investimento no combate à sazonalidade
O negócio da gestão de activos hoteleiros não é propriamente novo. Teve o seu ‘boom’ com a crise económica que assolou o País, e o mundo, mas se os tempos conturbados ficaram para trás, o mesmo não se pode dizer destas empresas. Pelo contrário, quem já existia, evoluiu e continua a dar cartas no mercado. Outros, analisaram o mercado, viram novas oportunidades e criaram o seu negócio.
Mas que negócio é, hoje, a gestão de activos? Como é que estão no mercado e como é que vêem o destino? E o futuro? Foram estas questões que nos levaram a juntar quatro responsáveis de empresas diferentes naquele que é o 3.º Business Breakfast Publituris Hotelaria powered by Roca, que teve lugar na Roca Lisboa Gallery. Margarida Almeida, da Amazing Evolution; Francisco Nogueira de Sousa, da Blueshift; Marco Rodrigues, da OCRAM; e Miguel Velez, da Unlock Boutique Hotels; são os protagonistas deste debate.
O negócio
A Amazing Evolution e a Blueshift são as empresas mais antigas entre as convidadas. Fundadas em 2012, nasceram como resposta às dificuldades na gestão de activos hoteleiros na altura. Margarida Almeida, managing partner e fundadora, considera que “houve uma evolução muito grande”: “Hoje, é uma gestão muito mais profissional do que era há dez anos. Quando a crise se instalou, a maior parte dos projectos era gerida directamente pelos particulares ou pelas marcas. Abriu-se aí uma oportunidade, no caso da Amazing, e penso que é transversal, que foi, com a experiência que tínhamos – a minha não era de hotelaria –, poder criar outras formas de aproximação à gestão de activos, com racionais que, até então, eram completamente inexistentes.”
A carteira de clientes começou com “as instituições financeiras, depois vieram os particulares, os family offices, e, agora, acrescentam-se os fundos privados, sobretudo internacionais, que querem investir no País e precisam de um local operator partner”.
Francisco Nogueira de Sousa, CEO e fundador da BlueShift, traz uma “experiência muito parecida”. “A única diferença é que, hoje em dia, somos contactados maioritariamente por proprietários de hotéis, quando o negócio não lhes está a correr conforme tinham pensado.” “E começamos a sentir agora uma procura imensa de pessoas que se candidataram ao 2020 e cujo período de carência está a terminar e começam a aperceber-se que não está a correr como o previsto.”
A BlueShift assinala, ainda, “uma transformação engraçada na forma como estamos a comunicar. Começámos com instituições financeiras e o tipo de relação e linguagem que se cria para esta evolução ao longo dos últimos cinco anos é incrível”, diz Francisco Nogueira de Sousa, precisando que “chegámos a um ponto em que é tudo tão diferente que quase não lhes importam coisas que para nós eram quase que métricas fundamentais e é dada importância a coisas que, para nós, tem uma relevância muito significativa”.
Cronologicamente, segue-se o aparecimento da Unlock Boutique Hotels, numa lógica muito diferente das anteriores. Miguel Velez, fundador e CEO, explica que a empresa surgiu de um “exercício de marketing”. “Na altura achámos que realmente os hotéis mais pequenos tinham um problema de dimensão e a ideia foi tentar juntá-los e, de alguma maneira, criar um conjunto de serviços partilhados. Depois começámos adquirir unidades e, agora, temos um misto dos dois negócios”. O gestor fala, também, nos términos dos períodos de carência de dos diversos fundos e alerta para a taxa de crescimento de quartos prevista no futuro. Mas já lá vamos.
Falta-nos apresentar a OCRAM. O elemento mais recente na área. Marco Rodrigues, managing partner – que traz consigo experiência na hotelaria –, explica que a empresa nasceu “efectivamente da operação”, há um ano. “Fomos abordados por um banco, que nos perguntou se estaríamos interessados na gestão de um activo. Começámos como esta unidade e melhorámos muito a rentabilidade do próprio hotel. Depois, numa outra frase, criámos a marca.”
Oferta turística e preço
A subida do preço médio em Portugal foi um dos temas que mais debate criou entre os convidados e que, como não poderia deixar de ser, levou à questão da oferta, a existente e a que está projectada.
É unânime entre os gestores que o preço praticado em Portugal não é o desejado. Mas a sua subida ou a forma como o fazer gera mais atritos.
Miguel Velez começa por falar na oferta turística e na sua perspectiva de aumento, afirmando que “a taxa de crescimento de quartos disponíveis é muito superior a taxa de crescimento dos turistas”. Algo que, mesmo não havendo qualquer crise no futuro mais próximo, poderá impactar o preço.
O CEO da Unlock defende que a “elasticidade do preço” acaba sempre por quebrar e que para que o preço suba é preciso que todo o destino o faça. “Não estamos sozinhos no mercado, a elasticidade de preço vai até uma certa altura, portanto é preciso que os outros subam para subirmos um pouco mais. E o problema do excesso da oferta é que, ao aumentar o número de quartos a um ritmo superior ao que cresce a procura, mesmo em taxas de crescimento aceleradas que estamos a ter, leva obrigatoriamente a que o mercado em geral faça uma pressão sobre o preço.”
Uma consideração na qual Margarida Almeida não se revê a 100%. “Depende do posicionamento que quisermos. Faço isso diariamente e depende daquilo definimos para o projecto. E eu não cedo. Neste momento, não baixo o preço. Temos a nossa métrica anual, que varia consoante a taxa de ocupação e da época, mas chega a um limite que não baixo”, explica a responsável da Amazing.
“É verdade que também estamos num ciclo positivo e, como tal, temos de esperar pelos tempos menos bom, que espero que tardem. Mas acho que é esse o grande desafio: criar produtos diferenciadores. Acho que faltam marcas internacionais de referência em Lisboa, no Algarve, no Porto e no Interior. Também faço a gestão de hotéis no Interior e sei quão difícil é. Isso ia ajudar a aumentar o nosso preço. Agora, têm de ser marcas diferenciadoras”, salienta.
Embora concorde com a necessidade de diferenciação, Miguel Velez é directo ao dizer que, “mesmo que alguns produtos sejam diferenciadores e tenham marcas muito especificas, não conseguem continuar o seu caminho normal de subida do preço porque a elasticidade acaba por partir”.
Marco Rodrigues adiciona outra variável à equação, numa área concreta do País: a “falta de concorrência” no Interior.
Mas concorrência esta que seja diferenciadora e não só porque os tempos convidam ao investimento, concordam os gestores.
Tour operação e investidores
A conversa sobre o preço leva, invariavelmente, ao debate sobre a tour operação e a dependência do sector em determinadas regiões, como é o caso do Algarve e da Madeira.
É Miguel Velez que traz o assunto para cima da mesa, referindo que, apesar de não existirem sinais de crise, a verdade é que o Algarve “já começou a ter problemas nas vendas” devido ao ressurgimento de mercados como a Turquia e a Grécia e ao fenómeno Brexit.
“Há muitos hotéis no Algarve que estão 50% abaixo de reservas para o Verão do que estavam no ano passado. E é um problema de tour operação”, afirmou, ressalvando que a maioria dos projectos na região está dependente da tour operação: “Agora estão todos a tentar realinhar as agulhas, a tentar fazer um equilíbrio, mas a verdade é que a tour operação enche um período de meses muito superior. Começa muito mais cedo e acaba mais tarde.”
Marco Rodrigues mostra-se de acordo com Miguel Velez, avançando que a dependência deste negócio no Algarve ronda os 40%; enquanto Margarida Almeida confessa não ter este tipo de negócio, mas foca a necessidade de diferenciação e inovação para que esta dependência não se dê. “Penso que há um trabalho que temos todos de fazer. Não nos podemos resignar a isso, não digo que os tour operadores não são importantes, mas não podem ficar com a fatia maior do negócio”, defende a responsável da Amazing.
Miguel Velez, que concorda de fundo com o problema da falta de diferenciação, vai, mais uma vez, directo ao assunto quando fala no problema do investimento que tem de ser pago.
Francisco Nogueira de Sousa usa a palavra para falar na origem destes desafios: “Creio que o que o grande problema está na forma em como esses hotéis são feitos: não são criados conceitos, as pessoas não pensam em inovação, diferenciação e, depois, estão, dependentes de terceiros ou do próprio mercado. Se criarem o próprio mercado, isso não sucede da mesma forma.”
No entanto, o responsável da BlueShift faz, também, referência à “pressão do proprietário em pagar as contas”, que, por vezes, acaba por levar ao negócio da tour operação com o intuito de equilibrar a caixa.
A Madeira depara-se com um problema maior dado negócio assente na tour operação.
Falta de recursos e salários
Outro dos desafios apontados pelos gestores de activos hoteleiros, e no qual são consensuais, é a falta de pessoal. O tema foi referido por Marco Rodrigues, segundo o qual, esta área assume proporções ainda mais complicada no Interior. O responsável da OCRAM refere, também, a necessidade de haver mais formação.
Miguel Velez vai mais longe e aponta algumas razões para esta falta de pessoal: “Porque há pessoas que não querem trabalhar, por um conjunto de outros motivos e, claro, porque não se paga especialmente bem no sector. E não se paga não é porque alguém anda a meter dinheiro no bolso, é porque não é possível e isso advém de um baixo preço médio.” O aumento salarial só é possível alterar através da subida de preço, o que tem de ser feito “pela qualidade e por posicionar o País como um destino de qualidade”.
Francisco Nogueira de Sousa também fala nos ordenados “miseráveis” e acrescenta a necessidade de manter os colaboradores motivados e com perspectivas de carreira.
Serviço e profissionalismo
Margarida Almeida acredita num futuro do mercado e do negócio “risonho”, mas alerta para os “factores que não controlamos”. “Não vejo o futuro como sombrio, há uma parte que está nas nossas mãos, que é criar coisas novas e diferentes e dar serviço”, algo do qual a gestora não abdica como característica fundamental no desenvolvimento do Turismo em Portugal, mas que, confessa, não tem a certeza se o mercado está ciente.
Marco Rodrigues é da opinião de que “o mercado vai estabilizar” e afirma: “Lisboa já se enquadra como um mercado bem sedimentado a nível mundial. O Porto ainda esta numa fase sensível, que ainda não se equilibrou como mercado e é fundamental termos as duas maiores cidades do País a trabalharem bem.”
“Concordo a 1000% quando a Margarida diz que é preciso serviço. Sou um grande defensor de serviço, não consigo partilhar um bom preço médio se, de facto, não tiver um bom serviço. Agora o problema é precisamente a falta de recursos humanos, não só no Interior, mas no Litoral”, recorda o managing partner da OCRAM, salientando que “só podemos providenciar um bom serviço se tivermos quadros para tal e não temos”. “As fornadas que saem das escolas actualmente são muito inferiores à procura”, salienta.
“Julgo que o verdadeiro paradigma da hotelaria em Portugal não passa por analisar se vai crescer ou não, passa por arranjar a melhor estratégia para que esse mercado se mantenha e isso é feito através do serviço. Se não vamos ter de começar a importar”, conclui Marco Rodrigues.
Francisco Nogueira de Sousa retoma o assunto dos salários, para dizer: “Pagamos miseravelmente às pessoas e começa por aí: esta é uma indústria que se tornou pouco atractiva para se trabalhar. Como ser humano, se tiver outra opção que me chateia metade ou na qual não tenho as mesmas preocupações, e não tiver uma perspectiva de carreira ou que vou crescer, porque é que aceito uma proposta de trabalho?” Para o responsável da BlueShift, “é nossa responsabilidade tornar a indústria atractiva”.
“Penso que o maior problema que vivemos neste tempo, quando as coisas estão a correr bem, é ter administradores que vêm de áreas completamente diferentes a pensarem que são o máximo e que percebem muito disto e esquecem-se que andamos aqui há mais de 20 anos, já passamos por ‘ups’ e ‘downs’ e criámos resistências. São pessoas que entram numa altura de ‘up’ e fazem uma avaliação apenas do que conhecem, querem uma análise qualitativa de algo e esta indústria é muito mais do que é o óbvio”, explica Francisco Nogueira de Sousa, adiantando o que diz serem dois “factores cruciais”: a experiência do cliente, primariamente referia por Margarida Almeida; e os colaboradores. “Vou parecer um pouco romântico, mas é nisto que acredito: não há nada mais importantes que os nossos colabores e as nossas equipas. E as equipas sentirem-se que realmente estamos empenhados em ajudá-los a crescer e desenvolverem-se, conseguimos reter talento.”
A necessidade de mais marcas internacionais no País foi igualmente consensual entre os gestores, que falam no interesse das insígnias, mas explicam que o RevPar em Portugal, um dos critérios de avaliação, não é atractivo.
Por fim, os gestores falam na “falta e profissionalismo” que existe na gestão hoteleira, como denominou Francisco Nogueira de Sousa e no qual se reviram os homólogos. E neste capítulo entram os investidores que não se estão a precaver para o próximo ciclo económico, mas também os projectos fruto de fundos e cujo período de carência está a terminar.