Tecnologia como enabler da melhoria da experiência de cliente
Leia a opinião de Sérgio Guerreiro, professor universitário e diretor-executivo no Westmont Institute of Tourism & Hospitality, Nova SBE.
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Depois de dois anos muito duros, o setor do turismo está a conhecer uma aceleração clara do seu processo de recuperação.
Com efeito, os últimos indicadores da atividade turística divulgados recentemente pelo Instituto Nacional de Estatística e pelo Banco de Portugal mostram que dormidas e receitas do turismo deverão superar em abril os resultados alcançados no mesmo mês de 2019, sendo que, no caso das receitas do turismo, estamos perante o segundo mês consecutivo em que tal ocorre.
As previsões para 2022 divulgadas no último boletim económico do Banco de Portugal apontavam para que as receitas do turismo atingissem 84,8% do valor de 2019, o que já correspondia a um crescimento bastante acima da média mundial. A confirmar-se a tendência dos últimos dados divulgados pelas autoridades estatísticas, é possível que o ano de 2022 venha a fechar com resultados acima do previsto.
Estes resultados são excelentes notícias para um setor fortemente impactado pela pandemia e que tem aqui condições para recuperar receitas e equilibrar a sua situação financeira.
Mas, na verdade, estes resultados podem encerrar em si alguns riscos. Por um lado, se a pandemia parece começar a evoluir para um fenómeno que não terá implicações em termos de restrições futuras às viagens, o setor confronta-se com novos desafios, cujos impactos ainda não se conhecem totalmente. A escalada da inflação e o conflito na Ucrânia constituem fatores de risco com implicações macroeconómicas muito importantes, com trajetórias que ainda não são definidas e que podem desde logo impactar a propensão das pessoas a realizar viagens turísticas, seja pela redução do rendimento disponível, seja pelo aumento de custos dos serviços turísticos.
Do meu ponto de vista, estes resultados (ou melhor, a reação perante estes resultados) podem conter ainda um outro fator de risco, igualmente perigoso, e que se prende uma potencial ideia de que nada mudou e o consequente esmorecimento da dinâmica de investimento em temas críticos como a transição digital e climática ou de redesenhar modelos de negócio.
Estes dois anos de pandemia, para além de limitativos de um modo de vida a que estávamos habituados, trouxeram consigo alterações de padrões de consumo, mobilidade, relação com o posto de trabalho, adoção de tecnologia, redescoberta das nossas cidades e países e permitiram que tivéssemos um período “autorizado” para testar novos padrões de comportamento. Algumas delas com sucesso.
O trabalho remoto é um exemplo paradigmático destas alterações e um dos fatores que pode explicar a transferência da força de trabalho do turismo para outros setores, onde a flexibilidade que hoje é pretendida é mais fácil de implementar.
Todas estas alterações de padrões de vida e de consumo têm impacto nos negócios turísticos e requerem um processo de adaptação das empresas no sentido de conferirem mais autonomia, flexibilidade e previsibilidade aos seus clientes, com ainda maior elevação da qualidade de experiência. Exigente. Mas possível. E a tecnologia pode ajudar.
Numa conferência recente, tive oportunidade de discutir este tema e de levar alguns casos de estudo de melhoria efetiva da experiência dos turistas em diferentes etapas da sua jornada.
Desde logo, na simplificação das viagens, com a introdução de tecnologia de reconhecimento facial que permite reduzir significativamente os processos de controlo nos aeroportos, que estão hoje a sofrer com o aumento de procura e dificuldades de recrutamento de colaboradores.
Ainda na fase de preparação da viagem, a Expedia está a utilizar a Amazon Alexia para ir fornecendo informações aos clientes sobre a viagem futura, seja sobre requisitos de viagem, condições climatéricas ou outros elementos que reduzam a ansiedade dos turistas antes da viagem e que garantam que essa etapa é realizada com sucesso. Autonomia, flexibilidade e previsibilidade.
A retoma da procura turística traz consigo desafios de gestão de fluxos e existem hoje casos muito interessantes de dynamic pricing em museus ou equipamentos culturais que permitem controlar fluxos turísticos e maximizar a receita desses equipamentos, com marcação antecipada para slots horários pré-definidos e diferenciação de preço em função dos volumes de procura, a que se juntam soluções que permitem aos locais usufruírem de recursos turísticos nos locais onde vivem. Autonomia, flexibilidade e previsibilidade.
Discutimos também soluções de tecnologia inteligente em hotéis, com o envolvimento dos clientes no processo de inovação de serviço, em que são convidados a votar nas inovações que gostaram mais ou menos. É um processo em tudo similar à estratégia de inovação da Lego, que criou um portal de inovação onde pede à comunidade para votar no produto que a empresa venha a lançar no mercado, com base em ideias propostas pela própria comunidade. Autonomia, flexibilidade e previsibilidade.
Finalmente, ainda no ramo hoteleiro, uma tendência crescente para dar autonomia aos clientes na escolha dos conteúdos que podem ver nas televisões dos quartos, permitindo-lhes continuar a seguir a série que estão a ver na Netflix ou em qualquer outro canal streaming. Autonomia, flexibilidade e previsibilidade.
Esta alteração de padrões merece um acompanhamento de perto pela indústria destas tendências e um esforço de investimento em smart technology para continuar a garantir a qualidade da experiência dos clientes.
Sérgio Guerreiro
Professor universitário. Diretor-executivo, Westmont Institute of Tourism & Hospitality, Nova SBE
*Artigo de opinião publicado na edição de junho da Publituris Hotelaria