Que futuro guarda a Serra da Estrela para a hotelaria?
Campanhas de comunicação, suspensão de portagens e isenções de IMI são algumas das sugestões apontadas pelos hoteleiros para recuperar o destino após os incêndios.
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A 6 de agosto deflagrou um incêndio em Garrocho, no concelho da Covilhã, que viria a dizimar um terço do Parque Natural da Serra da Estrela, num total de 28 mil hectares. Apesar de não terem existido unidades hoteleiras atingidas pelo fogo, os cancelamentos não se fizeram tardar.
O presidente da Entidade Regional de Turismo do Centro de Portugal (TCP), Pedro Machado, reporta que entre 12 e 15 de agosto a procura turística para a Serra da Estrela teve “quebras entre os 12% e os 15%”, sendo que nalguns casos pontuais as quebras ficaram “acima dos 60% a 70%”. Os hoteleiros confirmam a afirmação.
No caso do Hotel da Fábrica, localizado em Manteigas, “mais de 50% da faturação prevista foi cancelada em agosto e setembro”, de acordo com o proprietário desta unidade, João Clara, que explica que o mês de setembro, que antecipavam como “magnífico”, dado o volume de reservas, foi o mês que mais sentiu devido a desistências e cancelamentos.
Já nas Casas de São Lourenço e das Penhas Douradas, as quebras no mês de agosto e setembro ficaram entre os 15% e os 20%, de acordo com o proprietário, João Tomás, uma realidade também sentida no Vila Galé Serra da Estrela, com o diretor da unidade, Ricardo Teixeira, a apontar uma “quebra na procura, e consequentemente na ocupação, de 23% face ao mesmo período do ano anterior”. Na Pousada Serra da Estrela a diretora, Teresa Silveira, aponta para quebras entre os 10% e os 15%, enquanto Luís Veiga, administrador executivo do Grupo Natura IMB Hotels, reporta quebras de 10% nos hotéis do grupo na Guarda na Covilhã.
Pegando nessa percentagem de 10%, Luís Veiga foi mais longe e decidiu projetar o que o valor poderia representar em termos de perdas nos 30 hotéis de Celorico, Covilhã, Gouveia, Guarda, Manteigas e Seia. O diagnóstico? Uma perda de, no mínimo, três milhões de euros até ao final de abril.
Só em prejuízo global, Pedro Machado indica que, em média, este possa situar-se “entre os 600 mil e um milhão e meio de euros”.
Posto este cenário, que futuro guarda a Serra da Estrela para a hotelaria e o que deve ser feito para recuperar o destino após os incêndios? Em entrevista à Publituris Hotelaria, os profissionais do setor, mais do que percentagens, apontam soluções, numa altura em que, tal como João Clara afirma, “não podemos ficar de braços cruzados”.
O desafio da comunicação
Todos os hoteleiros entrevistados, bem como o presidente da TCP, apontam para uma solução comum para reconquistar a confiança dos clientes: campanhas de comunicação.
De acordo com João Clara e João Tomás, a mediatização dos incêndios levou a que as pessoas tivessem receio de visitar o destino. Torna-se, assim, necessário “mudar a perceção dos consumidores, porque a Serra da Estrela não ardeu toda e é preciso que os cidadãos, os consumidores finais e estrangeiros saibam que aquele território está disponível”, como afirma Pedro Machado.
Apesar de um terço do Parque Natural da Serra da Estrela se encontrar destruído, João Clara lembra inúmeras vezes que “Manteigas propriamente dita não teve quaisquer alterações na sua paisagem, uma vez que os incêndios não incidiram na montanha do maciço central que cerca [a zona]”. Também Ricardo Teixeira e Teresa Silveira lembram que “grande parte dos pontos mais visitados ficaram intactos, como o Poço do Inferno, o Covão d´Ametade, a rota das Faias, a Lagoa Comprida, a zona da Torre e dos Piornos, o Covão dos Conchos, a Nave de Santo António ou os Cântaros”, esperando que possa servir como chamariz para que os hóspedes regressem.
“O grande desafio que temos pela frente é o da comunicação e reposição da realidade atual do Parque Natural da Serra da Estrela”, refere o proprietário das Casas de São Lourenço e das Penhas Douradas.
Nesse sentido, Pedro Machado garantiu que será lançado “um forte plano de comunicação em articulação com o Turismo de Portugal”. Como explica, estão previstas três campanhas de comunicação distintas: uma sobre destino; outra sobre incentivo ao consumo – colocando-se em cima da mesa a hipótese de os IVAucher poderem ser trocados nas unidades hoteleiras e de restauração da Serra da Estrela – e outra para captação de grandes eventos.
Aliás, a 12 de outubro, e no âmbito do plano de apoio e recuperação económica das zonas do país mais afetadas pelos incêndios, o Turismo de Portugal apresentou em Manteigas a campanha promocional de aldeias e vilas do interior “Grandes em…”. Nesta são explanadas as especificidades dos diferentes territórios, em particular dos mais afetados pelos incêndios, nomeadamente a Serra da Estrela. Em comunicado de imprensa foi especificado que a campanha, feita através de meios digitais, é dirigida tanto ao mercado nacional como internacional. Espanha será o primeiro país visado, já que, como indicado em comunicado por Luís Araújo, a iniciativa visa “colocar aldeias e vilas nos destinos turísticos do mundo”, com medidas que pretendem “repor a normalidade” da atividade turística nos territórios e “aumentar a sua resiliência”.
Na mesma sessão foram apresentadas as três linhas de apoio às empresas e aos territórios afetados pelos incêndios, no total de 10 milhões de euros. Estas ajudas financeiras, que constam da resolução aprovada pelo Conselho de Ministros, disponibilizam três milhões de euros para apoio à tesouraria das empresas, cinco milhões de euros para a qualificação da oferta e dois milhões de euros para transformar o turismo no território – para entidades públicas e também de natureza associativa.
De recordar que a estes 10 milhões juntam-se os 200 milhões prometidos para as zonas afetadas pelos incêndios, tendo-se previsto que a Serra da estrela receberia entre 40% a 50% desse valor.
No entanto, nem todos vêm os apoios monetários com bons olhos, como é o caso de João Clara, que assegura não precisar “de apoios financeiros, nem do Governo central nem do local”.
“Não quero apoios, quero só que se apliquem e que pensem nos empresários que salvam a economia local. Preciso que vão para o terreno e façam comunicação, o mais importante é tirar a imagem negativa que está neste momento e apresentarem uma imagem real”, defende João Clara. Assegura ainda que “o dinheiro estraga tudo. Pode resolver no momento, mas a mim o que me interessa é projetar o futuro para a quarta geração que me acompanha”.
Além das campanhas de promoção do destino
Se a criação de campanhas de promoção do destino Serra da Estrela é apresentada como uma solução consensual, Luís Veiga propõe medidas mais extensas.
Semanas antes de a Publituris entrevistar os vários intervenientes desta reportagem, decorrera uma reunião com a secretária de Estado do Turismo, Comércio e Serviços, Rita Marques, e com todos os municípios atingidos e representantes hoteleiros. Ao marcar presença nessa reunião, e perante a intervenção da secretária de Estado sobre a necessidade de “fazer estímulos à procura no destino”, Luís Veiga assegurou que “o principal estímulo que se poderia fazer era suspender as portagens imediatamente”, neste caso, as referentes à A23, A24 e A25.
“O destino não se compadece com as portagens mais caras do país e a [sua] suspensão de imediato, é fundamental para criar um estímulo ao destino, para que se torne mais barato e menos custoso, face ao preço a que estão os combustíveis”, defende, apontando para uma suspensão que poderia estender-se “até ao verão do ano que vem [ou até] serem suspensas em definitivo”, aliada à reposição das SCUT’s.
“Se as pessoas ainda têm de pagar portagens para cá vir, quando não há alternativa para cá chegar, é muito mau. E ninguém perceber isso no Governo, é muito mau. Além de terem enganado os residentes com o desconto que se fez o ano passado, que era para ser 50% e acabou por ser de 30%, pior ainda” adianta.
Mas também aliada a esta proposta, Luís Veiga afirma ser necessária a tão referida comunicação.
“[Caso a suspensão das portagens avance] tem de ser documentada, mediatizada. Tem de ser uma campanha dirigida, como ‘Vá ao destino que as portagens estão suspensas’. Às vezes mais vale uma campanha desse género que outra a dizer para visitar determinado museu ou para ir à Serra da Estrela”, explica.
Outra das medidas que defendeu na mesma reunião passou pela “isenção de IMI dos seis concelhos [afetados] durante o ano de 2023”, bem como a “isenção de taxas das câmaras municipais para todas as empresas dos seis concelhos”, desde que com uma comparticipação por parte do Governo para ambas as isenções.
Finalmente, e como já defendeu numa entrevista dada à Publituris Hotelaria em novembro de 2019, Luís Veiga afinca ser necessário terminar com a concessão com a Turistrela, que afirma “não cumprir com as suas obrigações”, apesar de abarcar 40 mil hectares do total de 100 mil do parque natural.
“Não cumpre as obrigações e depois ninguém fala nela. Parece que esta concessão não existe e que ninguém sabe que entrava o desenvolvimento do destino Serra da Estrela. É lamentável do ponto de vista político que não se tenha abordado isso de uma forma séria nesta reunião” defende.
Garantir a proteção futura do território
Os hoteleiros referem ainda a necessidade de soluções que visem a proteção do território, para evitar o cenário de incêndio para o próximo verão.
João Tomás refere a urgência de se criar um plano de “gestão da floresta”, com mosaicos de agricultura e floresta de árvores autóctones, evitando as grandes extensões de manchas de pinheiro. Fala ainda da necessidade de coordenação no combate aos incêndios, um ponto também defendido por João Clara, que assegura ter existido “uma descoordenação total” no recente fogo que assolou a serra. Por João Tomás, para que essa coordenação existisse bastaria “nos períodos de inverno, outono e primavera as entidades como a Proteção Civil, a GNR e os próprios bombeiros fazerem simulacros, perceberem como os incêndios serão combatidos nas regiões, como é que as equipas se distribuem, quem é que conhece o terreno”.
Num último ponto, o proprietário das Casas de São Lourenço e das Penhas Douradas menciona que é preciso proceder a fiscalizações no período do verão.
“Têm de existir autoridades que percorram a floresta nas zonas mais sensíveis, onde aparentemente se podem verificar focos de incêndio, e que pela sua presença militar desmotivem [atos incendiários]. O que assistimos ao longo do tempo é que os militares não estão [presentes]”, afirma João Tomás.
Afinal, quais são as perspetivas?
Se Teresa Silveira da Pousada da Serra da Estrela antevê perspetivas positivas, reportando que no hotel não sentiram quebras entre setembro e outubro – aliás, classificou o mês de setembro como “fantástico” – Luís Veiga aponta que não será possível reconquistar a confiança dos clientes a curto prazo.
“Temos clientes fidelizados que eventualmente não vêm este inverno, e certamente com as notícias que saíram, quem potencialmente podia vir não virá. Vamos ter aqui uma quebra significativa das receitas este ano”, defende.
Quando questionado sobre o potencial desvio de fluxo turístico para outras regiões, Pedro Machado afirmou que no TCP sentem “que a procura voltou de alguma forma a normalizar dentro das unidades hoteleiras que já estavam aptas e disponíveis para receber”.
Sobre esta temática, Luís Veiga é da opinião de que “a apetência pelo destino continua porque é o único destino de montanha que temos no país”, contudo, precisa de ser “mais bem tratado”, como foi o caso do Douro.
“Estamos num destino low cost em que sobressaem projetos de topo, mas [estamos entre] o Douro e o Alentejo, que são destinos que se têm afirmado do ponto de vista qualitativo. O destino Douro não existia há 20 anos, [mas] houve uma proteção claramente política à volta [da região], e a serra da Estrela continua aqui no meio [como] o parente pobre dos destinos turísticos em Portugal”, termina.