“Estamos na hotelaria para ir contra o standard”
Localizado em São Lourenço, na Ericeira, o Immerso é dirigido a “amantes da natureza”.
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Gonçalo Menezes, um arquiteto apaixonado por surf, viu na Ericeira o potencial de esta se tornar na Biarritz de Portugal. O seu tio, Pedro Lopes, acionista na Inspire Capital, acreditou na visão e, juntos, criaram o primeiro hotel de cinco estrelas na Ericeira, o Immerso.
Da compra do terreno à abertura da unidade distam oito anos e um investimento de seis milhões de euros. Após a abertura, a 15 de julho, o acionista e o Host Managing Partner falam com a Publituris Hotelaria sobre o investimento feito na região, os públicos que pretendem captar e as estratégias para 2023.
Este é o primeiro investimento da Inspire Capital na hotelaria. Porque decidiram apostar neste setor e na Ericeira para o projeto?
Pedro Lopes (PL): Sempre gostei da indústria hoteleira como plano de vida. Estive muitos anos ligado à indústria e quando decidi sair, criámos a Inspire Capital. Começámos a investir em várias áreas e um dos setores potenciais era a hotelaria. O Gonçalo, que é meu sobrinho, teve a ideia de fazer aqui uma guesthouse e começámos a trabalhar em conjunto. Entrámos como sócios, mas para um acionista, [uma guesthouse] não servia. Começámos a crescer o projeto e saiu este hotel. [Escolhemos a Ericeira porque] o Gonçalo achou que podia ser a Biarritz de Portugal. Vimos que [na zona] o turismo era muito tradicional – na hotelaria está entre o Vila Galé e os hostels. A Ericeira tinha este potencial, só que ao nível do turismo a oferta [era] pouco qualificada. Pretendemos qualificar essa oferta.
Quando surgiu a ideia para este projeto?
PL: Comprámos o terreno há oito anos. A minha mulher e o Gonçalo viram este terreno – que nem era o que eu preferia (risos) – mas reconheço que fui vencido. E ainda bem, que este vale é espetacular, tem uma vista fantástica sobre o mar. [Entretanto], tivemos muitos problemas com o empreiteiro, terminámos em gestão direta da obra. Depois veio a pandemia, que dificultou ainda mais a abertura do hotel. Inicialmente, deveria ter aberto em julho de 2020.
Qual o valor final do investimento?
PL: Cerca de seis milhões de euros.
O que diferencia esta unidade das restantes da Ericeira?
PL: [O facto] de ser um projeto construído por uma família que se preocupou com todos os detalhes. Há muitas coisas que são nossas, da minha mulher, do Gonçalo, do arquiteto que nos acompanhou desde o início. E isso faz com que o ambiente do hotel seja diferente. Quando entramos, a primeira coisa que notamos é o aroma, que foi desenhado pelo perfumista Lourenço Lucena para nós. Depois, temos um empresário ligado à área da música que desenvolveu todas as playlists – cada espaço, para cada hora, tem uma música adequada. Tentámos criar algo a 360 graus, multissensorial. Temos um hotel de cinco estrelas, de luxo, mas um luxo descontraído, em que as pessoas podem estar de chinelos, calções, ir à praia e à piscina. Não é o luxo tradicional.
Para que públicos se destina esta unidade?
Gonçalo Menezes (GM): Este hotel é para amantes da natureza, mas não somos exclusivos de ninguém. Queremos ser um hotel em que toda a gente se sinta bem.
PL: Este é um hotel em que as pessoas podem vir em família, mas não é um hotel em que vamos ver famílias muito grandes com crianças a gritar e a correr. Como o Gonçalo disse, sem excluir ninguém, diria que é um hotel mais de casais, entre os 30 e os 60 anos, com poder aquisitivo, que gostem da natureza, do mar, da tranquilidade. Diria que não é o hotel para todas as pessoas que têm dinheiro, é para quem está disponível para gastar esse dinheiro como uma experiência com os pés na terra, mais tranquila, discreta e menos espalhafatosa.
GM: Somos um slow hotel, onde as pessoas conseguem sair do dia-a-dia e vir sem pressas. [Como dizemos], aqui o dia não tem horas, tem tempo.
Que nacionalidades pretendem atrair para a região?
PL: Uma grande parte dos nossos hóspedes são americanos. Muitos europeus, alemães, ingleses, franceses, alguns espanhóis. Diria que metade dos estrangeiros são americanos. E o público português, obviamente. Temos aqui uma vantagem grande: estamos a 35 minutos de Lisboa, portanto, também estamos a 30/35 minutos do aeroporto de Lisboa. Às vezes os portugueses acham que deslocarem-se uma hora é muito tempo, mas os estrangeiros não têm problema nenhum em chegar ao aeroporto e andar 40 minutos de transfer [até ao hotel].
Tendo em conta os problemas que o aeroporto de Lisboa está a passar neste momento, isso poder ser um constrangimento para a vossa unidade?
PL: Sou um otimista por natureza e acho que este hotel vai estar aqui nos próximos 50 anos. Esses constrangimentos no aeroporto são conjeturais, se calhar são deste verão. Se não fôssemos otimistas tínhamos desistido deste hotel, com todos os problemas que teve para arrancar e a pandemia. Se conseguimos abrir o hotel como queríamos, não são problemas de uma hora de fila de espera no aeroporto ou de alguns voos cancelados que vão complicar. Complica todo o turismo, é óbvio, e nós estamos dentro do ecossistema do turismo, por isso tudo o que é bom para o turismo é bom para nós, e tudo o que é mau para o turismo é mau para nós. Mas creio, sinceramente, e sem querer entrar na parte política do assunto, que não é um tema que nos preocupe.
Durante a Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, o Turismo de Portugal enfatizou a necessidade de inovação das indústrias ligadas ao mar, incluindo o turismo, bem como o papel do surf na proteção dos oceanos. Estando o Immerso situado numa zona reconhecida pela prática de surf, têm alguma estratégia nesse sentido?
PL: Desde logo, temos uma parceria com o surfista português Tiago Pires. Os clientes que quiserem aulas de surf podem usufruir das mesmas na escola do Tiago Pires, que é embaixador do Immerso. [O hotel] está muito comprometido com a comunidade, não só com o mar. Para nós, a sustentabilidade só tem uma razão de ser, que são as pessoas. Queremos uma sustentabilidade social. A maior parte dos nossos empregados e fornecedores são da zona, praticamente tudo o que está aqui é português. Encomendamos muitas obras a artesãos portugueses. Na nossa escala, o que podemos fazer é cuidar do sistema em que estamos inseridos. Sobretudo, as pessoas precisam de ter dignidade no trabalho, ser bem pagas, respirar, estar tranquilas. Acho que beneficiamos por estar fora de Lisboa, porque muita gente que trabalha em Lisboa vive fora [da cidade], e algumas pessoas vieram trabalhar connosco para melhorar a qualidade de vida.
A sustentabilidade da operação também é algo que têm em conta no Immerso?
PL: Desde o início, logo com o projeto de arquitetura.
GM: Tentámos ser o menos invasivos possível. Este terreno era de socalcos e a própria arquitetura foi desenhada para ter o mínimo impacto. Se estivermos na praia é muito difícil ver o hotel, e até aí fomos um pouco contra o típico projeto para ser mais rentável. Em hotelaria, o mais rentável é ter quase um prédio – uma divisão ao meio e quartos de um lado e de outro. Também estamos na hotelaria para ir um pouco contra o standard, o normal.
PL: Como não somos hoteleiros demo-nos ao luxo de perguntar porque é que não se pode fazer diferente. Em todos os materiais usados, a preocupação foi sempre maximizar a eficiência energética dos edifícios, seja pelos materiais de construção, pelos vidros, o tipo de caixilhos… Tudo isto teve a preocupação de criar o mínimo impacto possível na paisagem. Ainda não temos a produção elétrica com painéis solares, mas temos painéis para aquecimento de água e a água que usamos de rega é de um poço.
Já conseguem adiantar as taxas de ocupação para este verão?
PL: Como sou otimista iria dizer muito altas, mas ainda é cedo. Estamos no Booking desde ontem [7 de julho]. Diria qualquer coisa a rondar acima dos 50%.
GM: Já tivemos um fim-de-semana a 100%. Só para o verão, penso que conseguimos uma taxa de 80%. No que diz respeito à taxa de ocupação e à Ericeira, sou bastante otimista.
Acham que a sazonalidade pode ser um desafio para o Immerso?
PL: Para o turismo, é. Mas temos uma vantagem grande: as pessoas que gostam mesmo de surf gostam do turismo fora do verão, que é quando há melhores ondas. A Ericeira em setembro, outubro, novembro, dezembro é muito concorrida.
GM: A época alta das ondas acaba por ser a primavera e o outono e é nessa altura que vamos ter mais mercado relacionado com o surf.
PL: Mas temos muitas estratégias para chamar pessoas. Em setembro vamos abrir o Emme on Fire, um restaurante de fogo com o chef Alexandre Silva, onde teremos eventos quinzenais de cozinha no fogo, jantares apenas com reserva e [atividades] para acompanhar. Depois, vamos ter uma série de workshops ligados ao wellness e ao bem-estar, como Yoga, e coisas ligadas à zona onde estamos, com artesãos, bem como visitas especiais programadas àquilo que é, se calhar, um dos segredos mais bem guardados de Portugal – o Convento e a Tapada de Mafra. Felizmente, [estes locais] têm à frente pessoas com muita flexibilidade e visão para o turismo e estão disponíveis para criar eventos como jantares à luz de archotes na tapada, por exemplo. Depois, temos [as atividades] mais habituais, como passeios a cavalo e de bicicleta.
GM: E temos outras coisas, como reuniões de empresas e apresentação de produtos. Acho que vamos combater bem essa sazonalidade.
Têm-se falado muito na dificuldade na contratação de recursos humanos para o setor hoteleiro. Também sentiram essa dificuldade?
PL: Sentimos e continuamos a sentir. Ainda nos faltam dez ou doze pessoas.
Alguma área específica em que tenham mais dificuldade em contratar?
PL: Todas. Desde o restaurante, bar, sala, housekeeping, front-office…
GM: Estamos a precisar de uma a duas pessoas para cada área. Não é difícil encontrar pessoas, é difícil encontrar as que queremos. [Um dos] maiores elogios [que temos tido são] os nossos colaboradores – que são simpáticos, preocupados. São exatamente o que sempre quisemos no Immerso, ter uma preocupação e cuidado extra, e todos têm. Tem sido um desafio da parte de recursos humanos encontrar essas pessoas, porque preferimos ter dez colaboradores certos, do que dez certos e dois errados.
Quantos posto de trabalho conseguiram criar até agora?
GM: Neste momento, arredondando, 50 postos.
Acreditam que a guerra na Ucrânia está a condicionar a vinda de turistas de fora da Europa para Portugal?
PL: Em termos turísticos, Portugal normalmente beneficia quando há instabilidade noutros sítios, porque é um país periférico e pacífico. Quando temos aqui muitos americanos, creio que parte pode ser por isso. [Na altura da Primavera Árabe], os países de Marrocos à Tunísia sofreram e o turismo português beneficiou. Se calhar as pessoas têm hoje mais receio de ir a uma Croácia ou ao Montenegro e preferem vir a Portugal, que está mais longe desse ponto de vista.
Com a previsão de crise para 2023, qual é a vossa estratégia para o próximo ano?
PL: Estamos a tentar posicionar o hotel no segmento mais alto possível. Isto tem a ver com a oferta que fazemos, mas também com a política de preços, [que nos permite] segmentar. Os segmentos mais altos de consumo normalmente são pouco afetados pela crise. Acho que podemos beneficiar com isso. Destinamo-nos a uma faixa de mercado relativamente estreita, que obviamente pode sentir a crise, mas o grosso desse segmento creio que passa imune. De tal maneira que estamos a pensar subir os preços.
Existem projetos para novas unidades?
PL: Costumo dizer que isto foi o primeiro hotel. Se foi o primeiro, é porque à partida haverá um segundo. Mas ainda não temos projetos em concreto.